[ Ai, Maria João ]


"Quando nos apaixonamos,ou estamos prestes a apaixonar-nos, qualquer coisa que essa pessoa faz - se nos toca na mão ou diz que foi bom ver-nos, sem nós sabermos sequer se é verdade ou se quer dizer alguma coisa - ela levanta-nos pela alma e põe-nos a cabeça a voar, tonta de tão feliz, e feliz de tão tonta.

E, logo no momento seguinte, larga-nos a mão, vira a cara e espezinha-nos o coração, matando a vida e o mundo e o mundo e a vida que tinhamos imaginado para os dois.

Lembro-me, quando comecei a apaixonar-me pela Maria João, da exaltação e do desespero que traziam essas importantíssimas banalidade. Lembro-me porque ainda agora as senti. Não faz sentido dizer que estou apaixonado por ela há 15 anos. Ou ontem. Ainda estou a apaixonar-me.

Gosto mais de estar com ela a fazer as coisas mais chatas do mundo do que estar sozinho ou com qualquer outra pessoa a fazer as coisas mais divertidas. As coisas continuam a ser chatas mas é estar com ela que é divertido. Não importa onde se está ou o que se está a fazer. O que importa é estar com ela.

O amor nunca fica resolvido nem se alcança. Cada pormenor é dramático. De cada um tudo depende. Não é qualquer gesto que pode ser romantico ou trágico. Todos os gestos são. Sempre. É esse o medo. É essa a novidade. É assim o amor. Nunca podemos contar com ele. É por isso que nos apaixonamos por quem nos apaixonamos.

Porque é uma grande bendita distracção vivermos assim. Com tanta sorte."

[ Miguel Esteves Cardoso @ Público 14.02.2012 ]